quarta-feira, 13 de junho de 2012

Frases assassinas: como destruir ideias e frustrar pessoas

"Não vai dar certo" é sem dúvida a frase mais célebre, mas um sonoro "Você está louco?", se não é a pergunta mais frequente, está entre as mais destruidoras

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Por Gisela Kassoy
Qualquer pessoa que já tentou inovar deve ter ouvido alguma frase assassina, daquelas que destroem uma ideia ou opinião. "Não vai dar certo" é sem dúvida a mais célebre, mas um sonoro "Você está louco?", se não é a pergunta mais frequente, está entre as mais destruidoras.
Porque as pessoas tendem a rejeitar coisas novas? Segundo os neurocientistas, todos os seres humanos possuem o chamado "cérebro reptiliano". Igualzinho aos répteis e demais seres irracionais, diante do desconhecido, ataca ou foge.

Raramente alguém ataca ou foge de uma ideia tal qual os animais, mas aquele risinho complacente não seria uma forma de ataque? E quando alguém diz algo do tipo "Aqui essas coisas não funcionam", ou aponta rapidamente os riscos da ideia, como se eles não pudessem ser contornados, não está atacando?

Há também formas humanas e razoavelmente elaboradas de fugir de uma inovação: vai desde um "Depois a gente conversa" até um "Vamos focar nas prioridades". Quem nunca ouviu algo assim?

Meio vazio ou meio cheio? (Imagem: Thinkstock)

Ainda bem que o cérebro humano não é apenas reptiliano. Além do mais, evoluímos: não há mais lugar para o destrutivismo pessimista. "Não vai dar certo", sem boas justificativas, hoje em dia pega mal. Também não é mais aceitável culpar outras pessoas ou situações, com frases como "A chefia não vai aceitar" ou "O mercado não está preparado". Afinal, somos responsáveis pela disseminação e implementação de nossas ideias, independentemente das circunstâncias.

"Fica difícil", ou "É complicado" nem pensar: a má vontade fica estampada

Infelizmente, há versões mais sutis e sofisticadas de se podar novas ideias, como o terrível "Esta é a única alternativa". Ora, se só há uma alternativa é por que as outras ainda não foram criadas, o que não significa que elas não possam vir a existir. "Das duas uma" ainda é melhorzinho, mas não seria melhor abrir a mente para mais de duas possibilidades?

"Estou certo ou estou errado?" também é uma expressão que inibe o raciocínio: a maioria dos fatos é complexa demais para alguém estar totalmente certo ou errado.

"Você não entendeu" é cruel: pode significar que quem emitiu esta frase considera que está tão certo que a pessoa, ao entendê-lo, só poderá concordar.

Finalmente, há a pior de todas, talvez a mais traiçoeira: é a tal da "É igual a..." e suas variantes do tipo "Já foi tentado". Ora, o que foi tentado – e não funcionou antes – justamente por causa disso pode funcionar depois! Além do mais, identificar uma ideia com outra anterior pode impedir a pessoa de ver a sutil diferença que fará toda a diferença.

Fique atento às frases assassinas. Perceba e corrija sua tendência a fugir ou atacar. Ela é normal, mas pode ser evitada. E não se deixe levar pela fuga ou ataque de outros. Suas ideias merecem consideração.

Gisela Kassoyé especialista em Criatividade, Inovação, Adoção de Mudanças e Programas de Ideias. Atua com consultoria, seminários, palestras e facilitação de grupos de ideias. Realizou trabalhos em quase todo o país e nos EUA, Europa e América Latina. Site: www.giselakassoy.com.br

Publicação original em 03 de junho de 2012, às 18h05min, www.administradores.com.br
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sexta-feira, 11 de maio de 2012

Defensor da Marcha da Maconha rebate deputados evangélicos

 
Foto: Bobby Fabisak/JC Imagem

Por Neco Tabosa, jornalista, um dos redatores do blog Filipeta da Massa

Sinceramente, eu não sei porque a bancada evangélica insiste nisso de ir uma vez por ano ao Ministério Público tentar proibir a Marcha da Maconha do Recife, um evento para a reflexão, que é pacífico e ordeiro e que acontecerá pelo quinto ano consecutivo no Recife.

Será que é falta do que fazer? Eles nunca leram o parecer do STF?

http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=194435

“Por entender que o exercício dos direitos fundamentais de reunião e de livre manifestação do pensamento devem ser garantidos a todas as pessoas, o Plenário julgou procedente pedido formulado em ação de descumprimento de preceito fundamental para dar, ao art. 287 do CP, com efeito vinculante, interpretação conforme a Constituição, de forma a excluir qualquer exegese que possa ensejar a criminalização da defesa da legalização das drogas, ou de qualquer substância entorpecente específica, inclusive através de manifestações e eventos públicos. (...) Destacou-se estar em jogo a proteção às liberdades individuais de reunião e de manifestação do pensamento. (...) verificou-se que a <marcha da maconha> impugnada mostraria a interconexão entre as liberdades constitucionais de reunião – direito-meio – e de manifestação do pensamento – direito-fim – e o direito de petição, todos eles dignos de amparo do Estado, cujas autoridades deveriam protegê-los e revelar tolerância por aqueles que, no exercício do direito à livre expressão de suas ideias e opiniões, transmitirem mensagem de abolicionismo penal quanto à vigente incriminação do uso de drogas ilícitas. Dessa forma, esclareceu-se que seria nociva e perigosa a pretensão estatal de reprimir a liberdade de expressão, fundamento da ordem democrática, haja vista que não poderia dispor de poder algum sobre a palavra, as ideias e os modos de sua manifestação."

A Marcha da Maconha não incita o consumo de nenhuma substância que porventura ainda seja proibida no Brasil.

Tentar proibir a Marcha da Maconha fere a Constituição Brasileira, lei fundamental, suprema e desconhecida por esses senhores, onde é resguardado o direito de reunião pública e da livre expressão a qualquer cidadão. Inclusive aos Evangélicos e a Marcha da Família Deles.

E mais: leitores do Filipeta da Massa lembraram que antes de ser o Deputado dessa coisa suprapartidária e supradesconectada da realidade que se chama Bancada Evangélica, o Pastor Cleiton Collins atendia pela alcunha de Dj Banana e nunca foi exatamente contra o consumo de drogas. Haja visto que discotecava techno.

Fonte: Blog de Jamildo (POSTADO ÀS 19:18 EM 09 DE Maio DE 2012)

quarta-feira, 18 de abril de 2012

A Marcha vai descriminalizar a Maconha no Brasil

Em junho de 2011, apenas 15 dias depois da violência policial contra a Marcha da Maconha de São Paulo, o Supremo Tribunal Federal colocou em pauta uma ação que estava parada desde 2009. O STF julgou, por 8 X 0, a favor da Marcha da Maconha na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental  nº 187 e garantiu que aconteçam todas as Marchas da Maconha pelo Brasil, baseado no inciso XVI do artigo 5º da Constituição Federal.
Agora, temos outra ação importantíssima na Suprema Corte que pode descriminalizar o porte de pequena quantidade para uso próprio de qualquer substância proibida ou, quem sabe, descriminalizar todo o artigo 28 da Lei 11343/2006. Isso não significa que a maconha será legalizada, mas já sinaliza um grande avanço nessa direção. Legalizar é regulamentar, estabelecer onde pode ser consumida,  quanto se pode plantar, portanto, ainda estamos um pouco longe da legalização. Porém, estamos nos aproximando da descriminalização, que seria acabar com a pecha de que maconheiro é bandido, criminoso, todo o discurso hipócrita desse sistema penal que apenas serve para prender e punir os pobres e mais nada.
Consumir maconha, portar pequena quantidade, plantar pequena quantidade para uso próprio, todas essas condutas, podem deixar de ser crime e sair da esfera do sistema penal.
A nossa representação à Procuradoria-Geral da República em 2009, que gerou as ações no Supremo Tribunal Federal, foi importante. Contudo, o que trouxe à pauta e nos deu a vitória foi a mobilização que veio das ruas de São Paulo e ecoou na Corte, que descriminalizou a Marcha da Maconha.
Agora, vamos à rua e lotar as Marchas para descriminalizar a maconha no Brasil.

ANDRÉ BARROS. Advogado da Marcha da Maconha
FONTE: http://maconhadalata.blogspot.com

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domingo, 18 de março de 2012

O título de 1987 merece mesmo ser dividido.

(Aos torcedores de FUTEBOL ou NÃO,
Mudei de ideia. Concordo com PEDRO LAZERA, o título de 1987 tem que ser dividido!)

O título de 1987 merece mesmo ser dividido.

"É justo.                                                                                    

O flamengo de 87 era um timaço. Tinha zico, andrade, renato, zinho e outros.

E esse time aí venceu adversários dificílimos: São Paulo, Inter, Grêmio, Atlético.

Por isso que eu acho que a torcida do flamengo tem todo direito de dizer que ganhou o campeonato brasileiro dentro do campo.

Mas em que campo?

O campo da falta de palavra? Não é isso que acontece quando você assina um contrato e descumpre?

O regulamento estava lá. Assinado por todos.

Um regulamento esdrúxulo, concordo. Afinal, em que outro campeonato o vice-campeão do ano anterior ficaria de fora da elite?

Nós já vimos muitos regulamentos toscos, e nem por isso ninguém descumpriu.

Em 2000, o Malutrom poderia ter sido o campeão brasileiro. O Vasco, de Eurico Miranda, jogou a final contra o São Caetano, que era de outro módulo.

Nós mesmo já jogamos um campeonato pernambucano com três turnos. Ganhamos os três, mas pelo regulamento, teríamos que jogar uma final. Jogamos.

O Inter poderia se recusar a jogar contra o Mazembe. É justo um time que enfrenta uma Libertadores difícil ter as mesmas chances que um time do Congo?

Será que estamos falando do campo da esperteza, do trambique, da malandragem?

Ou seria o campo da covardia? O próprio zico é um amarelão de primeira. Ou você esqueceu aquele pênalti que ele perdeu na Copa? Ou quando ele abandonou o flamengo numa época difícil, já como dirigente?

No dia da final, o Sport estava no campo. Esse sim, um campo de verdade. E o “timaço” com zico, zinho, renato e leandro nem sequer apareceu.

E nao apareceu por quê? Soberba? Medo? Não interessa.

O fato é que o Sport disputou um campeonato muito mais dificil que o flamengo. Com Inter de Limeira, Guarani, Bangu e um adversário que supera todos os outros do módulo verde juntos: a banda podre do futebol brasileiro.

Enfrentamos acordos escusos, a manipulação, os interesses corporativos, a ganância. E nesse jogo, meu amigo, são 11 contra 11 milhões de dólares.

Já perdemos muitas vezes para os interesses dessa banda podre. Em 82*, contra o próprio flamengo, quando anularam nosso gol da classificação num lance absurdo. Ou na primeira final da Copa do Brasil, contra o Grêmio, com mais um erro “fantasma”.

Mas em 87 não. Em 87 nós ganhamos.

E diferente de uma decisão de 180 minutos, enfrentamos uma decisão ainda mais árdua, cansativa, que durou vários e vários anos.

Até que a justiça brasileira finalmente soprou o apito final, considerando a sentença como trânsito em julgado.

A prova definitiva, irrefutável de que éramos os verdadeiros e únicos campeões.

Mais do que um título, o campeonato de 1987 é um símbolo de luta.

É a prova de que existe sim esperança contra quem engana, distorce, manipula e mente. Contra um sistema que tenta empurrar goela abaixo o que bem entende. O que é mais rentável. O que é mais fácil.

Essa estrela que a gente carrega no peito com tanto orgulho merece sim ser dividida.

Não com o flamengo e sua tentativa patética de contrariar os valores e leis de uma nação.

Mas sim, com você.

Você que respeita as leis e é honesto.

Você que trabalha todo dia com dignidade.

Você que tem valores.

Você que acredita que pode vencer qualquer adversário, mesmo que ele seja maior, tenha mais dinheiro e mais poder.

Mais do que rubro-negra, a vitória do Sport é verde e amarela.

Sempre foi, sempre vai ser e para sempre será.

#Sportcampeão87"

Pedro Lazera


 * No dia 31 faz 30 anos. Não vá esquecer! A maior garfada da história do futebol brasileiro! 

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

RANKING DA VERGONHA

Brasil – maior consumidor de agrotóxicos do mundo.

 
Foto: Sanakan
Foto: Sanakan



Um bilhão de litros. O volume de agrotóxicos que as lavouras brasileiras receberam em 2010 chegou à nossa mesa junto a legumes, grãos, frutas e verduras que consumimos diariamente. Tão sério quanto essa realidade é o fato de que a maioria das pessoas simplesmente não acredita ser capaz de mudar esse quadro. E acaba colocando goela abaixo mais de cinco litros de veneno anualmente. A conta é simples. Basta pegarmos o montante de veneno e dividi-lo pela população do Brasil, de 190 milhões de habitantes hoje. Como se não houvesse outra saída, seguimos consumindo passivamente alimentos contaminados de substâncias químicas altamente nocivas ao nosso organismo. Fazer pregação contrária, de busca de novas alternativas, muitas vezes nos obriga a ouvir argumentos estarrecedores. Faça um teste você mesmo. Discuta o tema em uma roda de amigos, ou em casa, com a família. Fale do perigo eminente da agricultura tradicional e ouvirá coisas do tipo: “como é que vamos fazer para comer, então?”; “não tem como produzir em larga escala sem agrotóxico e os orgânicos são caríssimos”; “esse é o preço que pagamos por morarmos na cidade grande”. E ainda, o pior de todos que já ouvi: “desde que nascemos, morremos um pouco a cada dia, com ou sem agrotóxico”. A questão não é de morte. Mas de vida. Aliás, de qualidade de vida. E há quem garanta, com propriedade, que consumir alimentos saudáveis, vindos do campo para a nossa mesa, não só é possível como também é o caminho futuro da agricultura.
 
Agroecologia - É o caso do ator Marcos Palmeira, que abraçou a agricultura ecológica e é dono de uma fazenda na Região Serrana, no Rio de Janeiro, onde produz mais de 60 itens. Ele foi entrevistado pela ECOLÓGICO (edição nº 20, de 20 de maio de 2010) e na ocasião nos deixou um recado bastante otimista: “A ecologia é uma preocupação de todos hoje. Mesmo quem ainda não a pratica, acabará cedendo. A empresa que não se adequar vai sair do mercado. Acho que a produção agroecológica é totalmente viável. Já existem até incentivos, com bancos financiando projetos a juros baixos”.
Marcos justifica o preço mais “salgado” dos orgânicos hoje. “O valor pago é o justo. Diferentemente do preço dos produtos convencionais, nos quais não estão embutidos os custos com tratamentos e medicamentos pelo consumo de produtos altamente nocivos à saúde”, diz.
O ator conheceu de perto a pressão em torno da agricultura tradicional quando resolveu plantar pela primeira vez.  Mas venceu a barreira das multinacionais de veneno, que detêm a agricultura no Brasil. “As grandes indústrias de veneno estão por trás de tudo, ‘ajudando’ os produtores a conseguir créditos bancários facilitados para plantar. Só que eu acredito na agricultura alternativa, saudável, sem agrotóxicos”, revela apaixonado.
Enquanto a agroecologia não se sobressai como o retrato da agricultura no Brasil, o uso indiscriminado de agrotóxicos e os riscos reais que eles representam à nossa saúde saltam aos olhos. É o que você confere a seguir:
 
De olho no lucro – Com a expansão do agronegócio na América Latina, empreendimentos agrícolas como a monocultura, de cultivos extensivos e intensos de agrotóxicos se proliferaram. Na corrida por mais produtividade, eles são utilizados em altas doses, garantindo, assim, grandes safras.
Tão logo as sementes caem na terra já ocorre a primeira aplicação de veneno (de muitas que virão). Junto ao aumento da exportação de commodities agrícolas e da maior participação no Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil que esse tipo de agricultura atinge, há também, de forma menos divulgada, o aumento da contaminação e de suicídios de quem lida no campo. Sem esquecer a contaminação silenciosa que a população dos centros urbanos vem sofrendo, ao consumir os alimentos dessa agricultura tradicional. E dos danos causados ao meio ambiente de forma geral.
Agrotóxicos + sementes transgênicas + fertilizantes. Esse é o cálculo firmado entre os produtores rurais e os fornecedores de veneno. Nesse negócio, as multinacionais garantem o preço fixo na venda. Os produtores asseguram safras robustas e lucrativas. As indústrias de agrotóxicos ampliam seus rendimentos, e nós, os consumidores de alimentos, “pagamos o pato” comprando pimentões, alfaces, sucos de soja, tomates e morangos envenenados.
Para Raquel Rigotto, professora e pesquisadora do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina do Ceará, os agrotóxicos contribuem com o aumento da produção de commodities, mas não com a segurança alimentar e ambiental. Ela diz que o governo Lula patrocinou o agronegócio em 100 bilhões de reais anuais em financiamentos, contra 16 bilhões para a agricultura familiar, modelo que realmente produz alimentos no Brasil. Mais: que o ex-presidente foi omisso e não mexeu na legislação de 1997 que concedeu isenção de 60% de impostos à indústria de agrotóxicos. “Ampliaram-se as commodities, mas o problema da fome no mundo persiste. A própria Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) reconhece isso”, lamenta. 
Se o governo Lula não foi bem avaliado por Raquel, o que dizer em relação ao atual, já que o Brasil vai aumentar o consumo de agrotóxicos ainda mais? O país pretende alcançar a meta de ser, até 2019, a nação que mais produz alimentos. Nossa produção agrícola poderá passar dos atuais 26% para 35% do que é produzido no planeta.
“Mais de 50% dos agrotóxicos consumidos no Brasil estão sendo usados nas plantações de soja, o que não significa alimentação para o povo brasileiro, mas concentração de terra, redução da biodiversidade, contaminação da água, do solo, do ar, dos trabalhadores e das famílias que vivem em torno desses empreendimentos”, avalia a pesquisadora.
 
Fiscalização – A lei que regulamenta o uso de agrotóxicos no Brasil é a 7.802, de 1989. E deveria controlar desde o tipo de produto que entra no país até a segurança em relação às embalagens dos produtos. Além disso, a legislação também determina como podem ser aplicados os produtos e quais os Equipamentos de Proteção Individuais (EPIs)  -luvas, botas, óculos, máscara, bonés, macacão, etc  - devem ser usados pelos trabalhadores.  
Há regras também quanto à aquisição dos agrotóxicos. A compra só pode ser feita mediante um receituário emitido por um engenheiro agrônomo, que determinará o produto específico para cada cultura.
A realidade no campo é outra. As irregularidades encontradas são muitas. A fiscalização de agrotóxicos é competência dos governos federal, estaduais e municipais. Em Minas Gerais, a Secretaria de Agricultura, Pecuária e Abastecimento realiza esse trabalho com a ajuda de técnicos da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). 
Nas propriedades visitadas são encontradas embalagens de agrotóxicos descartadas no meio ambiente sem a recomendada tríplice lavagem do recipiente, aumentando o risco de contaminação do solo, dos córregos, rios, mananciais e lençóis freáticos. É comum que o produtor seja orientado na primeira visita técnica e, na segunda, caso persistam as incorreções, receba uma multa.
O engenheiro agrônomo Décio Karam, da Embrapa Sete Lagoas (MG), participa das vistorias e diz que o que mais tem visto é a aplicação de agrotóxicos em culturas inadequadas. “O uso dos produtos foge às recomendações do Ministério da Agricultura. O produtor utiliza o mesmo agrotóxico na plantação de milho e de batata, por exemplo. Essa é uma das irregularidades que mais encontramos. Há também a falha no monitoramento desse uso em pequenas propriedades e a ausência dos EPIs pelos trabalhadores”, observa.
Conversando com Karam é fácil entender o caminho dessas irregularidades até a nossa mesa. “Nas plantações de milho são utilizados 2,5 quilos de agrotóxicos para combater insetos por hectare (o suficiente para alimentar um grupo de 400 pessoas). Somando-se a esse valor os fungicidas e os herbicidas, a conta pode chegar a seis quilos. Um hectare produz oito mil quilos de grãos. Cada pessoa consome, em média, 15 quilos desse milho (que recebeu veneno da semeadura até a colheita) por ano”, esclarece.
O Ministério da Agricultura é responsável pelo registro dos agrotóxicos no Brasil e o faz com a autorização do IBAMA e da ANVISA. Num estudo realizado em 2008, a agência reavaliou 14 ingredientes ativos contidos em fungicidas, herbicidas e inseticidas. São substâncias que podem provocar intoxicações agudas, câncer, má formação fetal, distúrbios hormonais e problemas pulmonares.
De acordo com a ANVISA, dos cinco produtos avaliados, que já foram banidos do país por suspeita de provocar doenças, apenas dois: o tricloform e a cihexatina, foram retirados do mercado nacional. O fosmete será mantido com restrições; já o endossulfam e o metamidofós serão proibidos também. Mas só em 31 de julho de 2013.
 
Os porquês - O metamidofós é um inseticida classificado pela FAO e pela Organização Mundial da Saúde como HHP (High Hazard Pesticide  - Produto de Alto Perigo). Ele foi proibido na China, em 2008. Depois disso a importação do produto pelo Brasil mais que dobrou. O coordenador de Agrotóxicos da Secretaria de Defesa Agropecuária do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento do governo federal, Luís Rangel, explica o motivo. “O anúncio em 2008 pela ANVISA de reavaliação de agrotóxicos devido às notificações internacionais de proibição, como o caso da China, despertou o anseio no mercado de que o produto poderia ser proibido e por conta dessa possibilidade houve um aumento das importações e da produção local. Depois de definida a retirada programada entre os ministérios, a importação foi proibida e foram definidos os prazos para utilização do produto até o esgotamento dos estoques.”
De acordo com Rangel, os agrotóxicos ocupam o quarto lugar no quadro de intoxicações do Ministério da Saúde, o que representa menos de um sexto dos casos do primeiro colocado: os medicamentos. “A sociedade está exposta a aproximadamente 35 mil tipos de substâncias químicas todos os dias. Desse total, apenas 400 são classificadas como pesticidas ou agrotóxicos no mundo. Em função dos números e das ocorrências de intoxicação, não se justifica o enquadramento dos agrotóxicos como um problema de saúde pública, uma vez que os números são irrisórios quando comparados a medicamentos, produtos de limpeza e animais peçonhentos”, afirma.
De julho de 2009 a março de 2010, 19 linhas de produção e 12,5 milhões de litros de agrotóxicos foram interditados no Brasil. Entre as infrações, produtos adulterados e com prazo de validade vencido. As multas somaram mais de R$ 2,4 milhões.
“Com os diagnósticos da fiscalização em âmbito nacional, a definição de metas e a organização de ações em eventos nacionais, que ocorrem todos os anos, é possível aumentar a efetividade do controle do poder público sobre essas substâncias e mitigar intoxicações ou resíduos não autorizados em alimentos”, aposta Rangel.
 
Chuva e leite tóxicos – Há regiões no Brasil onde o percentual de produção agrícola é altíssimo, como no Mato Grosso, estado campeão na produção de grãos. De seus 141 municípios, 54 respondem por 90% dessa produção e, consequentemente, pelo consumo de agrotóxicos.
Na região da Chapada dos Guimarães e no Pantanal há plantação de milho, soja, cana-de-açúcar e algodão. As lavouras respondem por mais de nove milhões de hectares plantados. De acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), o estado responde por 20% da produção agrícola do país.
Até a água que cai dos céus do Mato Grosso tem de médio a alto grau de toxicidade.
É o que sustenta o professor-doutor em Saúde Pública pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o médico Wanderlei Pignati, do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Mato Grosso. Há 10 anos ele estuda os impactos dos agrotóxicos. “Os destinos percorridos pelos agrotóxicos são muitos. Parte combate ‘pragas’ das lavouras, como insetos, ervas daninhas e fungos. Parte vai para o solo e para o ar. Outra porção contamina os lençóis freáticos, deixando resíduos na água potável, nos rios e córregos, afetando a saúde humana e animal. O restante condensa e vira chuva tóxica”, explica.
Pignati alerta para as três grandes bacias pertencentes ao Mato Grosso: a do Araguaia, a Amazônica e a do Pantanal. “Usar agrotóxicos e fertilizantes químicos aqui é mexer com três grandes bacias do Brasil e com as nascentes dos rios dessas bacias. Mas o agronegócio não respeita isso”, salienta.
Segundo a Organização Mundial da Saúde e a Organização Internacional do Trabalho, mais de sete milhões de pessoas sofrem anualmente de intoxicações por contato com agrotóxicos. Desse total, 70 mil casos evoluem para óbito. Vale enfatizar que para cada caso registrado há outros 50 sem notificação. “Jogar veneno é quase um ataque de guerra. Não há aplicação segura para o homem nem para animais, plantas ou para a biota como um todo”, enfatiza Pignati.
Lucas do Rio Verde, município do Mato Grosso sofre com a contaminação por pulverização aérea. Lá, a exposição anual aos agrotóxicos por habitante é de aproximadamente 136 litros. Em 2007 Pignati fez parte de uma equipe que iniciou uma perícia por lá. Em um dos estudos locais que coordenou o resultado obtido foi alarmante: em 100% das amostras de leite materno coletadas de 62 mães que amamentaram em 2010 havia contaminação.
Nos resíduos encontrados, substâncias de alta toxicidade como o endossulfam, o deltametrina e o DDE, um metabólico do DDT, proibido há mais de 10 anos no Brasil.
De acordo com Pignati, apesar de contaminado, ainda assim o leite materno cumpriu o papel de importante fonte nutricional, já que é composto por substâncias indispensáveis ao desenvolvimento dos bebês.
Para Pignati, que só consome produtos orgânicos, uma forma de tentar reverter os impactos dos agrotóxicos é cobrar um posicionamento dos proprietários dos centros de compras de legumes, frutas e verduras. “Precisamos fazer com que os governos federal, municipal e estadual façam um monitoramento sobre a quantidade, o tipo e o grau de toxidade dos agrotóxicos que estão sendo utilizados. O consumidor tem poder e, na hora da compra, deve cobrar informações sobre o alimento que está levando para casa. Cabe a ele questionar quem está fornecendo produtos de má qualidade e dizer não”, alerta.       
 
Direto do sacolão – Lavar os alimentos em água corrente antes de consumi-los é uma boa prática de higienização. Mas não resolve o problema por completo. Achar que a água vai retirar todo o veneno é ilusão.
Ainda assim, a dona de casa Vilma Soeiro Pinto, de Belo Horizonte, diz que se sente mais aliviada limpando os alimentos com água e um pouco de detergente (apenas naqueles que serão descascados antes de comer) assim que chega das compras. Ela costuma fazer “sacolão” uma vez por semana e não guarda nada na geladeira antes de lavá-los muito bem. Também gosta de colocar as verduras em uma solução de água e vinagre por aproximadamente 15 minutos.
“Aqui em casa tem muita gente e comprar produtos orgânicos sai caro. Lavo tudo muito bem e guardo em meus próprios vasilhames. Contudo, sempre fico com um pouco de receio de consumir os alimentos tradicionais, mas é o jeito”, diz.
O receio de dona Vilma faz sentido. Segundo a nutricionista Maria Marquez, a prática de lavar frutas, legumes e verduras antes de consumi-los, até reduz um pouco do veneno. Mas nunca elimina totalmente os resíduos. “O ideal é usar sempre água para lavar. Detergente nunca!”, adverte a técnica.
 
Controle biológico – Existem alternativas para driblar o uso intensivo de agrotóxicos em nossas lavouras. Como, por exemplo, fazer o manejo da cultura a partir do controle biológico. A essência do método espontâneo está em inserir predadores naturais na área de cultivo no intuito de provocar um declínio da população de pragas. 
A medida atóxica foi adotada por José Wanderlei de Rezende, no Sítio Bom Jardim, localizado no município de Ervália (MG). Rezende produz morangos sem agrotóxicos desde 2009 e conta que seu processo de certificação “SAT” (Sem Agrotóxico) já está sendo finalizado no Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA). Ano passado, o plantio foi de 10 mil mudas em uma área de dois mil metros quadrados. E o produtor pretende colher entre cinco e seis toneladas de morango em 2012.
Para controlar as pragas da cultura, é feita a aplicação de produtos biológicos. 
No combate à lagarta, por exemplo, ele usa a bactéria Bacillus thuringiensis. Nos pulgões (Metopolophium dirhodum), o Nim Indiano (Azadirachta A. Juss.). E, no mofo cinzento (Botrytis cinerea), o controle é feito com o Clonostachys rosea.
Os morangos são vendidos na Universidade de Viçosa e para a própria população de Ervália, com entrega em domicílio. Pioneiro na região na plantação de morangos, Rezende está feliz com o caminho menos agressivo que escolheu para manejar sua cultura e acredita que é viável produzir sem agrotóxicos. “Estamos vivendo em um século envenenado. Tudo hoje é à base de química. O uso de agrotóxicos no campo é indiscriminado. Ou seja, muitas pessoas estão comprando e levando veneno para a mesa. Mas acredito na produção saudável de alimentos. Por isso, prefiro oferecer ao meu consumidor mais qualidade”, defende.
O Brasil importa produtos biológicos. Mas já existe fabricação nacional. Uma delas, desenvolvida pelo laboratório de Biotecnologia Bthek, no Distrito Federal, em parceria com a Embrapa, é a bactéria Bacillus Thuringiensis Kurstaki, popularmente chamada de BT, capaz de matar lagartas e besouros e inofensiva ao homem, aos animais e ao meio ambiente. “A não ser pelos conservantes, não há aditivos químicos nem toxicidade alguma. O foco de utilização é o combate a lagartas da espécie lepidóptera em lavouras de soja, milho, trigo e algodão. Além de pastagens, hortaliças e em plantações frutíferas em geral”, diz Mateus Tozatti, diretor-geral do Bthek.
Boa notícia para o ser humano, os animais e a natureza, não? Só que a novidade esbarra na burocracia e na disputa de espaço com as grandes multinacionais que produzem veneno. As maiores  - Bayer, Dow, Basf, Monsanto, Syngenta e Du Pont  - concentram 70% do mercado nacional.
“Estamos esperando mudanças no que diz respeito ao registro de produtos biológicos. Uma delas, que já está ocorrendo, é a mudança no rótulo. A alteração não classifica mais os produtos biológicos como venenos. Já a concorrência, essa sempre vai existir. Temos de ser capaz de superá-la não só com ‘batalha’, mas muitas vezes com união e realização de alianças e parcerias”, acredita Tozatti.
O produto está, há mais de dois anos, em fase de registro no Ministério da Agricultura.
 
Logística reversa – Se o Brasil é o primeiro no ranking de consumo de agrotóxicos, também é campeão mundial na reciclagem de embalagens. Os recipientes podem ser guardados durante um ano. Antes de ser devolvido ao fabricante, tem de ser lavado três vezes e perfurado. O produtor deve enviar as embalagens aos postos de recolhimento autorizados pelo Instituto Nacional de Processamento de Embalagens Vazias (Inpev). O órgão, criado em 2001 pela própria indústria, já recolheu 170 mil toneladas de embalagens.
O Sistema Campo Limpo, que trabalha com a logística reversa de embalagens vazias de agrotóxicos, opera com 421 unidades de recebimento em 25 estados, além do Distrito Federal, cobrindo praticamente todas as regiões agrícolas do país. É o que garante Priscila Cunha, assessora de comunicação do instituto. “O Sistema Campo Limpo retira do meio ambiente quase 95% das embalagens primárias de defensivos agrícolas pós-consumo colocadas no mercado. De março de 2002 (quando entrou em funcionamento) até outubro de 2011, já foram destinadas mais de 198 mil toneladas de embalagens vazias. E entre janeiro e outubro de 2011, foram encaminhadas para o destino ambientalmente correto 29.790 toneladas em todo o país, volume que representa um crescimento de 10% em relação ao mesmo período de 2010”, registra.
De acordo com Priscila, os recipientes são reciclados ou incinerados. São passíveis de reciclagem, 95% das embalagens vazias de defensivos agrícolas: as plásticas, as metálicas e de papelão. Os 5% restantes são embalagens que tecnicamente não podem ser lavadas, como as flexíveis e que acondicionam produtos não misturados em água. Já as que não foram corretamente lavadas pelos agricultores também são encaminhadas para a incineração.
Atualmente são produzidos diversos artefatos por meio da reciclagem das embalagens vazias de agrotóxicos como tubo para esgoto, cruzeta de poste de transmissão de energia, embalagem para óleo lubrificante, caixa de bateria automotiva, entre outros.
O quadro ao lado mostra um comparativo da destinação de embalagens no Brasil nos dois últimos anos. A prática da logística reversa cresce.
 
Alternativas - Andar na direção contrária não é muito fácil, mas tem seu valor. Para quem está disposto a arregaçar as mangas e se alimentar melhor, dá até para planejar a própria horta em casa. Parece difícil, ainda mais na correria em que a gente vive hoje em dia. Mas é possível. Aos menos animados com a ideia, que já se adiantaram usando a desculpa de que moram em apartamento, há a sugestão do plantio em moradias verticalizadas.
É isso mesmo. Pensando em reestabelecer a integração entre os habitantes dos centros urbanos e a natureza, nasceu o ‘Dedo Verde Urbano’. Com técnicas simples e linguagem didática, o projeto incentiva uma vida mais verde e ensina (por meio de um vídeo) o passo a passo de todas as etapas do cultivo de uma horta de temperos em apartamentos.
“A intenção é sensibilizar o cidadão comum, que muitas vezes não enxerga no cotidiano das grandes cidades o prejuízo que suas atitudes trazem para si próprio. Mostramos que mesmo em áreas pequenas é possível cultivar uma pequena horta de temperos. É só ter dedicação e técnica”, explica o roteirista Hélio Lemos, idealizador do projeto.
Para participar basta ter boa vontade e aplicar as técnicas ensinadas no vídeo por uma equipe de especialistas em hortas urbanas. O resultado, além da parceria com a natureza e a contribuição para uma cidade mais harmonizada, está no prazer de poder tirar, na hora e direto do pé, os temperos para incrementar suas receitas caseiras.
Segundo Lemos, a crise urbana é cada vez mais intensa e só poderá ser enfrentada com sucesso dentro de uma concepção que vise à integração da cidade ao ambiente natural.
Em longo prazo, ele pretende promover a alfabetização ecológica da população. “Reconhecemos a marca dos carros estacionados na nossa rua, mas não sabemos nomear a árvore que temos na porta de nosso prédio que nos dá sombra o ano inteiro”, ressalta Lemos.
Ele acredita que o contato com o verde e a natureza amplia a percepção da vida. “Cuidando de um vaso de planta, de uma pequena horta, o ser humano pode redescobrir sua essência e transformar a cidade em um lugar melhor para se viver ”.
 

Publicação original: Cíntia Melo - cintia@souecologico.com (14/02/2012)
Fonte: http://www.revistaecologico.com.br/materia.php?id=42&secao=553&mat=549

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Há 5 anos é proibido prender usuários de drogas. Temos o que comemorar?

Por Sergio Vidal, exclusivo para o site do Cannacerrado*

Em outubro do ano passado comemoramos 5 anos da entrada em vigor da Lei de Drogas, a 11.343, de 23 de agosto de 2006. Uma das principais alterações trazidas por ela, em relação à anterior, é o veto à prisão de envolvidos em condutas relacionadas com o consumo de drogas, incluindo o cultivo para uso pessoal. Em outras palavras, a Lei de drogas passou a proibir a pena de prisão para os chamados “usuários”. Em março de 2007, poucos meses depois da entrada em vigor da Lei 11.343, o então Secretário Nacional de Políticas sobre Drogas, Gal. Paulo Roberto Uchôa, chegou a declarar que condutas que não tenham interesse de mercância não podiam ser consideradas como tráfico e por isso, pela nova Lei, não deviam ser punidas com a prisão.
Nessa época, muitos ativistas pela legalização da maconha comemoraram, especialmente os que defendem o cultivo para uso pessoal como uma estratégia de redução de danos sociais e à saúde. Todos tinham a esperança de que, com a nova Lei, policiais, delegados, promotores, juízes e outros operadores do Direito adotassem a postura de maior tolerância com os usuários cultivadores, já que esses realizam suas colheitas com a intenção de quebrar o vínculo com o tráfico de drogas e o crime organizado. No entanto, na prática, não é isso que temos visto ocorrer.
Desde a nova Lei, tem crescido o número de casos de pessoas que cultivam para uso pessoal detidas e submetidas à acusações de tráfico. Tais acusações, na maioria das vezes, são baseadas apenas na quantidade de plantas e de flores prontas para consumo encontradas com os réus. Infelizmente, em crimes relacionados com maconha e outras drogas não tem prevalecido a regra de que o ônus da prova é de quem acusa. Nesses casos, os usuários que cultivam sua própria maconha é que têm sido obrigados a provar que não são traficantes, ao invés de serem os acusadores obrigados a apresentar provas concretas da existência do crime de comércio não-autorizado.
No mesmo mês em que a Lei 11.343 completou 5 anos, uma sentença proferida na 2 Vara de Entorpecentes do Distrito Federal tornou-se o maior exemplo dessa inversão de valores. Sativa Lover, como gostava de ser chamado, usuário, ativista pela legalização, que cultivava maconha para seu uso pessoal desde 2006, foi condenado há passar 7 anos e meio preso, sob acusação de tráfico. Apesar dos policiais e da promotoria não terem apresentado nenhuma prova de tal acusação, a não ser 76 plantas em estágio vegetativo, dos mais variados tamanhos, a maioria pequenos brotos, 4 plantas em estágio de floração, cerca de 500 gramas de flores pronta para consumo e 30 gramas de haxixe. Após meses de investigação nenhuma prova de tráfico foi apresentada. Mas, ainda assim, o Juiz achou melhor condenadar um “acusado primário e de bons antecedentes”, a passar mais de 7 anos no sistema penitenciário brasileiro. Porque, para ele, “não se pode considerar que tamanha quantidade pudesse se destinar apenas ao consumo pessoal do réu”.
Sativa Lover não tinha armas, dinheiro, conta bancária, anotações ou qualquer outro indício de enriquecimento ilícito. Ele só tinha plantas, flores e resina. Na época da prisão ele tinha 23 anos, estava desempregado e tinha abandonado a faculdade por não ter como pagar os estudos, situação parecida com a de muitos jovens brasileiros. Foi preso no dia 4 de junho e está desde então afastado da conviência da família e dos amigos, instalado numa penitenciária pública. Usuário há muitos anos, em 2006, no mesmo ano de aprovação da Lei 11.343, após ser agredido e humilhado por um traficante, decidiu que nunca mais iria comprar maconha. Desde então passou a estudar sobre cultivo, se relacionar com outros cultivadores, se envolver com a cultura do cultivo e com o ativismo pela legalização da maconha, que vem crescendo em todo país. Na sentença, o Juiz afirmou que “sua conduta social é péssima. Não trabalha, não estuda, enfim é um verdadeiro devoto da maconha. Indolente e imaturo, vivia à expensas do tráfico de maconha, enredado com outros adoradores da erva. São pessoas que entregam-se à causa (venda e consumo de maconha, e projetos de legalização da droga) como verdadeira finalidade de vida.”
Desde que as primeiras Leis sobre Drogas foram criadas, e até os dias de hoje, se baseiam no príncipio de que o objetivo central da Lei deve ser proteger o bem tutelado conhecido como “Saúde Pública”. Ora, cabem então algumas perguntas: Se Sativa Lover estava desempregado, tinha abandonado os estudos e supostamente estava num estado de devoção à maconha, será que a melhor forma de ajudar a ele, sua mãe e outras pessoas da sua convivência é mantê-lo encarcerado com criminosos dos mais variados tipos durante mais de 7 anos? Será que os usuários de maconha e outras drogas que eventualmente precisem de ajuda ou tratamento vão mesmo se tornar pessoas melhores se ficarem anos presos com sequestradores, assassinos, assaltantes, estupradores, estelionatários, dentre outros tipos de criminosos? Será que manter ele e a outras pessoas que tenham cometido condutas semelhantes afastados da sociedade vai de fato ajudar a proteger a “Saúde Pública”? Pessoalmente, acho que não.
O Supremo Tribunal Federal já afirmou que julgará o mérito a respeito de se o artigo da Lei 11.343 que criminaliza as condutas relacionadas com o uso pessoal é ou não constitucional. Essa discussão está sendo feita em vários países do mundo, e já foi feita em muitos outros. Tudo indica que o STF optará pelo óbvio: adultos que utilizam uma substância em contexto privado estão, no máximo, atingindo apenas a si mesmos. Mas é preciso ficar atento, pois mesmo que o STF decida dessa maneira, ainda há muito o que fazer para colocar em práticas as mudanças necessárias acabar com a Guerra às pessoas que usam drogas.
Acho que já é mais do que hora de encararmos a realidade. Muitos usuários estão cultivando maconha para seu uso pessoal. Isso está se tornando cada vez mais comum e vai crescer mais a cada dia. Já existem muitas lojas especializadas nesse tema, sites e livros e, a própria Lei veta a prisão de usuários que cultivam, estimulando que esses procurem desvincular-se do tráfico. A questão agora é se vamos continuar passando a mensagem de que a policia e o Judiciário devem ser mais rigorosos com os usuários que cultivam a maconha que consomem do que com os que compram de traficantes, ou se vamos mudar não apenas a Lei no papel, mas principalmente na sua aplicação. Ou, pior ainda, se vamos continuar deixando essoas que mataram outras enquanto dirigiam sob a influência de álcool, ou políticos corruptos que roubam milhões de reais dos Cofres Públicos, responderem aos processos em liberdade ou serem sentenciadas à penas alternativas, enquantos usuários que se esforçam para deixar de financiar o tráfico de drogas continuarem sendo condenados injustamente com base em acusações sem fundamentos.


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Um abraço e até semana que vem!

* Esse texto pode ser reproduzido desde que citada a fonte e o link original.



Sergio Vidal é antropólogo e autor do livro Cannabis Medicinal – Introdução ao Cultivo Indoor   
Postado originalmente por Coletivo CannaCerrado em 20/02/2012.
(http://cultivomedicinal.com.br)